DOUTRINA DO BATISMO NA DECLARAÇÃO DE SAVOY, ROBERT KALLEY VOTARIA CONTRA OU FAVOR?
Joelson Gomes
Quem
lê a declaração de Savoy no capítulo 29 vai ver no seu parágrafo 4° que
os congregacionais ingleses eram pedobatistas. Claro que na própria
declaração, esse fato já é contraditório porque no parágrafo 1° está
escrito que o batismo foi ordenado por Jesus Cristo “para servir ao
batizando de sinal e selo do pacto da graça, de seu enxerto em Cristo,
de sua regeneração, da remissão de pecados e de sua total entrega a Deus
através de Jesus Crito para andar em novidade de vida”. Ora, não sei como os doutores de Savoy entendiam como tudo isso pode acontecer numa criança inconsciente. Mas, ninguém é perfeito.
Quando
a declaração de Savoy foi composta em 1658, é dito que todos os seus
artigos foram discutidos e para que fossem aceitos tinham que ser
votados na assembleia.[1]
Se Robert Reid Kalley o fundador do Congregacionalismo brasileiro
estivesse presente, ele votaria a favor ou contra o batismo infantil?
Esta pergunta é válida por dois motivos:
1- Alguns
dizem por desconhecimento não saber a posição do Dr. Kalley sobre o
assunto, e que ele não deixou nada escrito sobre o caso. Seria ele
pedobatista, já que sua origem é uma igreja pedobatista (o Dr. Kalley é
oriundo da igreja Presbiteriana escocesa sendo batizado, quando criança,
nesta tradição)?
2- Dentro
da Aliança Congregacional alguns pastores pelo o uso indiscriminado da
Teologia Sistemática de Louis Berkof terminam entendendo que o
pedobatismo é bíblico e até confundem ser reformado com ser pedobatista.
O que Kalley pensava? Qual seria o seu voto?
O
Dr. Kalley embora no início do ministério tenha aceito o batismo
praticado por sua igreja de origem, depois da maturidade logo o
rejeitou. Ele declarou sobre o batismo de criançinhas: “Estou
bastante satisfeito que crianças sejam batizadas, mas apenas crianças
que professam solenemente a Cristo e vivem vidas de acordo com o
Evangelho.”[2] E falando dos pré-requisitos para alguém ser batizado, ele disse:
Quanto
ao batismo de crianças, a Bíblia guarda silêncio a respeito. A
circuncisão era um rito limitado aos machos, no oitavo dia de
nascimento, e era aplicada pelo pai, pela parteira ou por qualquer outra
pessoa habilitada. Assim – Abraão aplicou-a em Isaque (Gn 21. 3 e 4); a
mulher de Moisés, Séfora, em seu filho (Êx. 4. 25); Paulo em Timóteo
(At. 16. 1-3). As condições essenciais para o batismo eram duas: a)
entender claramente a mensagem e b) de coração aberto aceitá-la. Fé em
exercício e alegria inteligente eram os pré-requisitos deste rito
cristão – totalmente nulos aos recém-nascidos.[3]
Se parassemos aqui já poderíamos ter ideia como seria o voto de Kalley. Mas, vamos adiante.
A
Igreja Congregacional Fluminense, primeira Igreja protestante do Brasil
e fundada e doutrinada por Kalley, exigia que quem tivesse sido
batizado quando criança, para ingressar nela fosse rebatizado. Como no
caso da senhora Cristina Fernandes Braga. William Bannister Forsyth
escreve:
Dona
Cristina Fernandes Braga, esposa de José Luiz Fernandes Braga, tinha
expressado já há muito o desejo de tornar-se membro da Igreja Evangélica
Fluminense, mas tinha sido impedida por causa da decisão da Igreja, que
exigia que fosse submetida ao batismo cristão, por aspersão. Dona
Cristina era de origem germânica e frequentara a classe da Sra. Kalley
na Escola Dominical em Petrópolis, quando moça. Tinha sido batizada na
infância por um ministro luterano. Convertida graças ao casal Kalley,
ela recusava ser rebatizada, por entender que o seu batismo infantil
havia sido um autêntico bastismo. Finalmente ela cedeu e aceitou o
rebatismo e foi assim também, admitida à Mesa do Senhor.[4]
Falando à Igreja Congregacional Pernambucana, também fundada por ele, Kalley diz:
A
Igreja Evangélica Pernambucana não pertence a nenhuma denominação
estrangeira: não é presbiteriana, porque esta considera válido o batismo
romano e pratica o batismo de crianças; aproxima-se mais da denominação
batista.[5]
Quando
entendeu que a Igreja Evangélica Fluminense precisava de um pastor
brasileiro, o Dr. Kalley mandou estudar no colégio de Spurgeon o jovem
João Manoel Gonçalves dos Santos, e o candidato de Kalley não era
pedobatista. O Doutor chegou a dizer ao seu amigo que este candidato
seria, quem sabe, o único antipedobatista do império na época.[6]
É sabido que O assunto batismo infantil não era novo em sua vida, pois
logo cedo, em sua família, o tema foi abordado quando sua primeira
esposa, Margareth, pediu para ser rebatizada porque estava convencida
que seu batismo, quando criança, não tinha base no Novo Testamento.
Diante disso, o Dr. Kalley prontamente lhe rebatizou.[7]
O filho adotivo de Kalley, João Gomes da Rocha, respondendo a uma carta sobre como o seu pai entendia o batismo, escreve:
Porque
sabemos qual foi o ensino do Dr. Kalley durante todo o seu pastorado
nas igrejas evangélicas que fundara no Brasil acerca da forma de batismo
de água aplicado à cabeça dos crentes adultos, depois de fazerem uma
confissão pública perante a igreja de sua plena fé no Salvador Jesus.[8]
Antes
de partir de vez do Brasil o Dr. Kalley deixou uma confissão de fé para
as igrejas que aqui fundou: os 28 artigos da Breve Exposição,
declaração aceita como síntese de fé pela Aliança Congregacional. No
artigo 25, que trata do batismo, ele escreve:
O
batismo com água foi ordenado por nosso Senhor Jesus Cristo como figura
do batismo verdadeiro e eficaz, feito pelo salvador, quando envia o
Espírito para regenerar o pecador (Mt. 3. 11; 1Co. 12. 13). Pela
recepção do batismo com água, a pessoa declara que aceita os termos do
pacto em que Deus assegura aos crentes as bênçãos da salvação (At. 2.
41; 8. 12).
Pela
leitura do artigo fica claro: o batismo com água só deve ser ministrado
para quem dá mostras de que é convertido, porque no entendimento de
Kalley a ordenança do bastimo é apenas um símbolo, uma figura do batismo
verdadeiro, com o Espírito Santo que supõe-se já aconteceu no batizando
no momento da regenração; por isso agora, o batizando está recebendo o
sinal, o selo, de algo que já supõe-se, aconteceu com ele (senão não
seria nem sinal, nem selo). Assim na ordem de Kalley as coisas acontecem
assim: regeneração e depois, batismo com água. E ainda ele diz no
artigo citado que ao receber este símbolo a pessoa batizada declara que
aceita conscientemente os termos, as leis, do pacto de Deus. Logo, no
entendimento do Doutor o batismo só pode ser um ato consciente. Ele
escreve:
O
batismo com água não é essencial para a salvação; sua aplicação externa
é um mero testemunho público, diante de testemunhas, de que se aprova
uma aliança (ordenança) que tipifica a purificação, o refrigério, o
conforto e o poder fortificante do Espírito Santo.[9]
É
sabido que o Dr. Kalley foi batizado quando criança na sua igreja de
origem na Escóciam nas nunca se conformou com isso, tanto que antes de
morrer pediu ao seu amigo, o pastor Fanstone que o batizasse, agora sim,
como crente. James, filho do pastor Fanstone, diz que realmente seu pai
batizou o Dr. Kalley a pedido dele que quis ser batizado como crente
confesso.[10]
Por
tudo isso acho que agora podemos dizer que se estivesse na assembleia
que aprovou a Declaração de Savoy o Dr. Kalley votaria contra na seção
batismo infantil.
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